O ano de 2013 foi um marco significativo no universo jurídico: foi o ano em que o Processo Judicial Eletrônico foi regulamento e oficializado. A Resolução 14/2013 determinava que petições iniciais e incidentais passariam a ser recebidas e processadas exclusivamente de forma digital. Esse episódio, que pode parecer simplório após quase uma década, causou uma grande movimentação em todas as esferas do Direito que se viram diante da necessidade de adaptar seus fluxos internos, equipamentos e infraestruturas para a nova demanda. Podemos afirmar que este foi o ponto de inflexão do mercado jurídico no sentido de aderir à Transformação Digital.
Ao longo desse tempo o PJe vem sendo incrementado e ampliado no sentido de criar uma solução única, gratuita e acessível a todos os operadores do Direito. Considerando-se as dificuldades de implementação de tal projeto em um país de dimensões continentais e burocrático, bem como a resistência de certa parte dos advogados às inovações; pode-se afirmar que o PJe vem evoluindo muito bem. No entanto ele representa tão somente o primeiro passo.
De acordo com dados do relatório Justiça em Números do CNJ, atualmente existem cerca de 80 milhões processos parados na justiça. É um número que só tende a se elevar, dado que o Brasil já é o país com o maior contingente de advogados no mundo. Para dar conta de promover a Transformação Digital em todo o sistema não se pode atribuir todo o esforço a uma única entidade. Seguindo essa lógica, surgiram as LawTechs.
Pode-se definir LawTech como uma startup com modelo de negócios escalável e inovador, que desenvolve produtos e serviços para o universo jurídico, criando e entregando produtos e serviços de base tecnológica com o intuito de melhorar o setor. Basicamente o termo se compõe da fusão entre duas palavras em inglês. Law, que significa “lei” ou “jurídico”; e tech, que representa “tecnologia”. Em outros países o termo se firmou como LegalTech, mas o conceito é o mesmo.
Vale ressaltar que produtos e serviços jurídicos não se restringem somente a softwares generalistas que também são utilizados por operadores do Direito, afinal processadores de textos e planilhas já são utilizados há tempos, desde o movimento de informatização das bancas na década de 1990. Quanto se trata de LawTech as soluções são muito mais específicas e de fundo tecnológico muito mais avançado. Consoante a essas premissas, o foco das LawTechs consiste em identificar demandas, deficiências e dificuldades do tanto do universo jurídico quanto das esferas do judiciário.
Categorias de LawTechs
Esse movimento vem se expandindo rapidamente no mundo inteiro. Não cabe comparar os números em termos de volume de empresas e de faturamento, pois são realidades muito distintas. No entanto o mercado nacional já vem se organizando em torno do assunto através de entidades como a AB2L – Associação Brasileira de Lawtechs e Legaltechs. A entidade que tem como missão apoiar o desenvolvimento de empresas, fomentar o crescimento do setor e estimular as melhores práticas profissionais já contabiliza mais de 150 startups jurídicas em operação.
Segundo a AB2L, as lawtechs no Brasil são divididas em:
- Analytics e Jurimetria – Plataformas de análise e compilação de dados e jurimetria.
- Automação e Gestão de Documentos – Softwares de automação de documentos jurídicos e gestão do ciclo de vida de contratos e processos.
- Compliance – Empresas que oferecem o conjunto de disciplinas para fazer cumprir as normas legais e e políticas estabelecidas para as atividades da instituição.
- Conteúdo Jurídico, Educação e Consultoria – Portais de informação, legislação, notícias e demais empresas de consultoria com serviços desde segurança de informação a assessoria tributária.
- Extração e monitoramento de dados públicos – Monitoramento e gestão de informações públicas como publicações, andamentos processuais, legislação e documentos cartorários.
- Gestão – Escritórios e Departamentos Jurídicos – Soluções de gestão de informações para escritórios e departamentos jurídicos.
- IA – Setor Público – Soluções de Inteligência Artificial para tribunais e poder público.
- Redes de Profissionais – Redes de conexão entre profissionais do direito, que permitem a pessoas e empresas encontrarem advogados em todo o Brasil.
- RegTech – Soluções tecnológicas para resolver problemas gerados pelas exigências de regulamentação.
- Resolução de conflitos online – Empresas dedicadas à resolução online de conflitos por formas alternativas ao processo judicial como mediação, arbitragem e negociação de acordos.
- Taxtech – Plataformas que oferecem tecnologias e soluções para todos os seus desafios tributários.
- Civic Tech – Tecnologia para melhorar o relacionamento entre pessoas e instituições, dando mais voz para participar das decisões ou melhorar a prestação de serviços.
- Real Estate Tech – Aplicação da tecnologia da informação através de plataformas voltadas ao mercado imobiliário e cartorário.
Quais beneficios as LawTechs trazem ao mercado jurídico
As tecnologias envolvidas em cada uma das categorias são diversas e em muitas situações se somam de modo a compor soluções mais ricas e complexas. As inovações incrementais e até disruptivas proporcionadas por essas tecnologias tem como objetivo proporcionar benefícios como a melhoria da produtividade através da automação, interoperabilidade de recursos através da integração de sistemas, democratização e transparência dos serviços jurídicos, redução de custos em diversas instâncias e desafogar o judiciário diminuindo o litígio com a melhoria dos processos operacionais do meio jurídico brasileiro.
O cenário é complexo, pois traz ao mercado uma série de conceitos, funcionalidades e recursos que a imensa maioria dos advogados não está familiarizada. Tal mudança vai exigir dos operadores do Direito uma nova mentalidade no que se refere à prática jurídica. Advogar será muito diferente nos próximos anos. Porém isso não significa que todos os escritórios e profissionais precisam adotar todas as soluções imediatamente. Como em todo processo de inovação, é natural que a mudança venha de cima para baixo, partindo das grandes bancas. Com o tempo os recursos vão se tornando mais acessíveis financeiramente e mais amigáveis operacionalmente. O único alerta é o seguinte: estamos na Era Exponencial, portanto essas mudanças vão ocorrer de forma mais acelerada do que o habitual.