Jovem Advocacia 4.0 | perfil e habilidades essenciais
Dezenas de milhares de novos advogados e advogadas adentram ao mercado anualmente após concluírem o bacharelado e adquirirem a tão almejada carteira da Ordem. Não bastasse a complexidade do ensino jurídico que exige o entendimento dos diversos ordenamentos jurídicos, a realidade da Jovem Advocacia vem sendo ampliada com os conceitos, métodos e tecnologias relacionados ao Direito 4.0 e suas tendências.
Dar conta de toda essa gama de conhecimentos e práticas não está sendo fácil para os juristas iniciantes. Por isso é importante compreender qual o perfil e quais novas habilidades estão sendo exigidas para os Advogados do Amanhã!
Mercado Jurídico em Transformação
O mercado jurídico é formado por todas as pessoas jurídicas e físicas que possuem demandas jurídicas de alguma natureza e efetivamente desembolsam valores monetários para essa finalidade. Atualmente é um mercado que movimenta R$ 50 bilhões por ano. E é um mercado que vem crescendo em torno de 20% ao ano. Além desse montante financeiro que determina o tamanho do mercado, outras variáveis como o volume de processos ativos e o contingente de advogados também são referências ao tamanho do mercado.
Nesse sentido o Brasil já é o país com a maior proporção de advogados por habitante do mundo (1 advogado para cada 164 habitantes) e o segundo maior em contingente de advogados ativos (mais de 1,5 milhão). Estes números representam quase o dobro de 5 anos atrás, portanto um crescimento realmente impressionante. Mais notório ainda é a projeção de que esse contingente pode dobrar novamente até o final de 2025.
Não é necessário realizar cálculos profundos para concluir que esses dados de volume e crescimento do mercado significam muito mais concorrência. E este não é o maior desafio imposto aos recém formados em Direito. A intensa transformação digital pela qual passa o mercado pode ser ainda mais pungente.
Advocacia 4.0: Digitalização e automação do escritório
Nos últimos anos o universo jurídico está presenciando uma profusão de ferramentas e soluções tecnológicas para digitalização e automação da advocacia. São recursos completamente impensadas há uma década. Esse conjunto de mudanças atualmente em curso traz uma nova onda de métodos, conceitos e práticas denominadas Direito 4.0 em alusão às tendências da Indústria 4.0 típicas da Transformação Digital.
Atualmente os escritórios de advogados estão em processo de se familiarizar com tantas tecnologias integradas à prática jurídica. A implicação direta dessas tendências é a busca pela melhoria da produtividade a fim de lidar com a elevada competitividade do mercado.
No Direito, a Transformação Digital já se impôs como um caminho sem volta. Digitalizar significa transferir tarefas e fluxos operacionais para os meios digitais. Ao mesmo tempo significa adotar uma nova mentalidade, novos processos e novos hábitos em relação aos processos e controles. Portanto a digitalização do escritório de advocacia é a própria Transformação Digital em ação.
Perder tempo com tarefas repetitivas não é mais tolerável para nenhum escritório. Este é o cenário que os estudantes de Direito se deparam quando chegam ao mercado. Mas será que eles estão sendo bem preparados para tudo isso?
Ambiente Acadêmico: as Faculdades de Direito estão acompanhando a era digital?
De acordo com o Conselho Federal da OAB, o Brasil é o país com o maior número de cursos de graduação em Direito no mundo. Segundo dados oficiais do MEC, temos mais de 1700 cursos em 920 Instituições de Ensino Superior.
O mercado desenvolveu critérios para avaliar estas IES quanto à qualidade das disciplinas referentes à doutrina jurídica. Não faz parte do escopo deste artigo adentrar nessa seara. Mas precisamos entender como as faculdades de Direito estão lidando com essa nova realidade do mundo digital.
Fato é que são raras as universidades que atualizaram seu conteúdo programático para englobar as novas práticas e tecnologias. Mesmo as Pós-graduações, as Especializações Lato Sensu e os MBAs das Business Schools / Escolas de negócios se encontram distantes dessa realidade.
Se os advogados precisam se digitalizar para se tornarem mais competitivos, as universidades precisam alterar o seu modo tradicional de ensinar. Reitero que não me refiro às disciplinas típicas da doutrina jurídica que é ministrada nos bancos acadêmicos. A minha questão é sobre furar essa bolha exclusivamente jurídica que persiste nas faculdades tradicionais a fim de que os estudantes de Direito assimilem as novas habilidades que o mercado exige.
Habilidades técnicas relacionadas ao Direito 4.0
Até poucos anos atrás as habilidades técnicas de advogadas e advogados se resumiam meramente ao conhecimento das doutrinas e ordenamentos jurídicos. Não que isso fosse fácil, pelo contrário. Compreender as Leis e suas aplicações sempre foi algo de elevada complexidade. E com o advento do Direito 4.0 muitos novos conceitos vieram se somar à bagagem técnica exigida para os juristas.
Tecnologias Transformadoras como Cloud Computing e modelos de serviços em nuvem são recursos básicos no cotidiano da advocacia. Ferramentas digitais para pesquisa jurídica, automação de documentos, revisão e análise de Contratos, acompanhamento de processos, jurimetria, comunicação e atendimento ao cliente já fazem parte do arsenal diário dos operadores do Direito.
Mais recentemente a Inteligência Artificial e os recursos para Aprendizado de Máquina (Machine Learning) invadiram a prática jurídica de forma avassaladora. Outras tecnologias emergentes como Web3, BlockChain, Tokenização, Smart Contracts e NFTs são pouco alardeadas, mas representam importantes oportunidades. Até mesmo as simulações e imersão em Ambientes Virtuais (Metaverso) que perderam o hype, continuam ativas e gerando demandas de todas as ordens.
Multidisciplinaridade dos Advogados do Futuro
Uma tendência que já se percebe há alguns anos no mercado em geral também vem ganhando força no setor jurídico: a Multidisciplinaridade, tanto na formação acadêmica quanto na prática cotidiana. Esse novo movimento está levando profissionais já graduados em Direito a buscarem áreas distintas daquelas onde obtiveram bacharelado.
Isso se deve ao entendimento de que o profissional multidisciplinar tem mais vantagens competitivas sobre aqueles monotemáticos. Afinal ele vai ter mais flexibilidade de atuação nas áreas comuns do mercado e não somente nos escritórios de advocacia. É cada vez mais comum nos depararmos com Advogados se especializando em segmentos mercadológicos diversos como Startups, eCommerce, Compliance, AgroNegócio, Crimes Digitais, Propriedade Intelectual, Data Privacy, CyberSecurity, Ambientes virtuais etc.
Movimento análogo também se verifica internamente aos escritórios de advocacia e departamentos jurídicos com elevada maturidade digital, os quais estão incorporando profissionais de disciplinas diversas, tais como design, estratégia, estatística, tecnologia, ciência de dados, BlockChain e Inteligência Artificial.
Todas essas habilidades técnicas são desejáveis para advogados de toda e qualquer área de atuação. Com o incremente das tecnologias transformadoras, outras novas skills devem se somar a essas listas. Mas nem só de habilidades técnicas vive um profissional. Atualmente o mercado de trabalho vem valorizando também as chamadas soft skills.
Habilidades sócio emocionais (Soft Skills) da Jovem Advocacia 4.0
A cultura industrial que predominou em todos os mercados nos últimos 150 anos só levou em consideração as habilidades técnicas, deixando os fatores humanos relegados a segundo plano. Na última década o universo corporativo começou a entender que a pressão sobre as habilidades técnicas estava afetando psicologicamente os trabalhadores. Então ao mesmo tempo em que as ferramentas digitais promovem automação, as questões emocionais e humanas passaram a ser mais valorizadas.
As Soft Skills são justamente as habilidades sócio emocionais como empatia, resiliência, respeito às diferenças, proatividade, visão crítica e analítica, criatividade, colaboração, liderança, adaptabilidade e aprendizado contínuo.
Este último conceito leva em conta que o aprendizado não se dá apenas no curto período de colégio e faculdade. Ele é necessário ao longo da vida toda. Por isso ele recebe a nomenclatura de LifeLong Learning. O conceito já existe há mais de uma década, mas a pandemia de covid-19 catalisou a sua utilização, já que potencializou os meios de aprendizagem (canais digitais).
LifeLong Learning significa aprendizagem flexível, autônoma, diversificada e disponível em diferentes tempos e lugares ao longo da vida. É uma busca contínua, voluntária e automotivada pela atualização do conhecimento, seja em âmbito profissional, acadêmico ou pessoal.
Em meio a tudo isso, é importante lembrar que o Ensino Universitário não vai deixar de existir. Ele continua sendo necessário para as formações técnicas como Direito, engenharia, arquitetura, medicina e tantas outras.
Jovem Advocacia 4.0 = Mentalidade Digital + Perfil Inovador
Um requisito fundamental para iniciar e se manter na jornada de digitalização é a mudança de mentalidade. Jovens Advogados e Estudantes de Direito precisam abrir a mente para as inovações sociais, processuais e tecnológicas. A mentalidade – ou “mindset” – reflete o modo de pensar e desenvolver raciocínios específicos. Consequentemente o mindset digital diz respeito à mudança intencional de conhecimentos, pensamentos, opiniões e crenças a respeito da gestão do escritório utilizando métodos e ferramentas digitais. Essa mudança de modelo mental vai além, pois a transformação digital trouxe consigo novos métodos de gestão, inovação e uso de dados.
Inovação é o processo promover melhorias incrementais aos fluxos operacionais a fim de produzir um resultado produtivo e ser adotado em grande escala gerando valor ao cliente e vantagem competitiva à empresa. Não necessariamente requer potentes recursos tecnológicos. Muitas vezes o perfil inovador está relacionado à criatividade e proatividade.
O advogado inovador e líder no mindset digital sabe lidar com incerteza, volatilidade e complexidade e consegue trabalhar e propor novas formas de pensar o uso da tecnologia, sempre ajudando o negócio a pensar e agir de forma conectada, aplicando as ferramentas tecnológicas de forma inteligente. Por entender que as soluções do passado não servem para problemas do presente, este advogado tem um olhar treinado para identificar as oportunidades e propor novas soluções mais eficazes que geram maior produtividade.
O futuro chegou também para a Jovem Advocacia! As novas habilidades não serão todas ensinadas nos bancos acadêmicos. Isso exigirá um esforço extra destes novos profissionais. Porém a facilidade de aprendizado desta geração será um fator de diferenciação em relação a antigos advogados que se mostram resistentes ao novo.
Autor
Sou escritor, produtor de conteúdo e criador de conceitos para o mercado jurídico. Consultor para digitalização e automação na Advocacia. Sou palestrante FENALAW e Autor dos livros “Advocacia e Transformação Digital” e “Presença Digital”. Ao longo dos 15 anos de atuação no Mercado Jurídico adquiri um profundo conhecimento dessa área e desejo ser protagonista na imensa transformação pela qual ela está passando.